Lei Seca, Mas Sem Espuma
Não se fala mesmo em outra coisa, neste mês: a tal lei seca, número
11705, que modifica o código de trânsito. Despenca a frequência aos bares paulistanos em até 40%. A pergunta é: quanto de álcool pode-se ingerir antes de dirigir? Um cálice de vinho? Um dedo de cachaça? Duas latinhas de cerveja? Resposta simples: nada. Os mais bobinhos perguntarão: "não dá para ir ao bar e tomar suco?" Na Folha, desta terça, lê-se:
" Balanço preliminar do Ministério da Saúde aponta que, nos 20 primeiros dias de vigência da lei que proíbe o consumo de álcool para motoristas, houve queda de 24% na média de operações de resgate de trauma feitas pelo Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) em 14 unidades do serviço em comparação com o mesmo período um mês antes. De 30% a 40% dos atendimentos do Samu no país são de trauma, categoria em que prevalecem acidentes de trânsito.A redução chegou a 47% na região metropolitana de Niterói, no Rio. O levantamento nacional compara o intervalo de 20 de junho a 10 de julho (na nova lei) com o de 20 de maio a 10 de junho (na lei anterior). "
Folha de São Paulo, 15 de julho, 2008.
Muita gente graúda tem conseguido o direito de não soprar o caninho
plástico do bafômetro, alegando que não poderiam construir provas contra si mesmos... Conseguem entender? Por exemplo: um policial aborda um carro suspeito, pede documentos ao motorista. O sabido meliante, conhecendo a situação, não mostra seus papéis (que comprovariam ser o tal veículo furtado, p. ex.) pois estaria construindo provas contra si próprio. Rir ou chorar?
O número de acidentes diminui e, com ele, o número de mortes, o que é louvável. Quando o estado nada faz pela segurança de seus cidadãos, toma pancada. Quando faz, toma também. Os mais tolos dirão que a lei é pesada, rigorosa, que o melhor seria "conscientizar" o povo. Daí o governo faz propaganda no rádio, tevê e mídia impressa. Os mesmos tolos falam: "esse governo gasta muito, devia prender bandido". Rir ou chorar?
Por Carlos H. Carneiro
2008: Uma Santa Ceia Moderna
“Na véspera de sua paixão, durante a última Ceia, ele tomou o pão, deu graças e o partiu e deu a seus discípulos, dizendo: Tomai, todos, e comei: isto é o meu corpo, que será entregue por vós. Do mesmo modo, ao fim da Ceia, ele, tomando o cálice em suas mãos, deu graças novamente e o entregou a seus discípulos, dizendo: Tomai, todos, e bebei: este é o cálice do meu sangue, o sangue da nova e eterna aliança, que será derramado por vós e por todos para remissão dos pecados. Fazei isto em memória de mim. (...)”
Palavras do livro sagrado do catolicismo, que podei distinguir em qualquer missa à que comparecerdes. Imaginemos, por um instante, que a última ceia tenha ocorrido nos dias de hoje e, se puderdes atender a ainda mais um capricho de vosso singelo interlocutor, pediria que mergulhassem na mais abissal das fossas de vossas imaginações, e figurassem a última reunião apostólica com seu mestre ocorrendo em nosso país. Pode vos soar fútil e inverossímil, mas não podia deixar de partilhar convosco desta idéia surreal que passara pela mente minha. No que diz respeito ao pão, sem problemas (a probabilidade de Jesus acrescentar um adendo a seu discurso quanto ao alto preço do pãozinho seria grande, já que não era lá tão rico). Mas e quanto ao vinho, ó caríssimos! Como o Mestre voltaria a sua morada, aonde quer que ela fosse? E se topasse com o tão temido bafômetro?!
Sátiras à parte, temos de reconhecer os bons resultados que a assaz polêmica Lei Seca nos vem proporcionando. A queda nos índices de acidentes de trânsito já é significativa, refletindo bonanças em diversos outros setores, como o da saúde, já que os leitos que ocupariam os acidentados que não mais sofrem acidentes podem ser destinados a outras pessoas. A raiz de toda a polêmica gerada reside nesta questão: todo este radicalismo se faz mesmo necessário? Analisando os fatos, concluímos que sim, já que em nosso país a palavra prevenção não se vê presente nos programas e leis do governo, já a palavra punição encontra-se presente em larga escala.
Exemplificando o que acima foi dito temos as cotas universitárias (a idéia não é a mesma, mas o que tento apontar é a ineficácia do governo em programas que visem prevenir), questão também muito polêmica, onde o governo mais uma vez mostra-se incapaz (ou seria desinteressado?) de melhorar a educação de base que nos é fornecida, o que tornaria possível ao vestibulando do ensino público ingressar por conta própria no mudo do tão sonhado ensino superior. A primeira medida que deveria ter sido tomada visando uma diminuição no consumo de bebidas alcoólicas seria a extinção de todo e qualquer tipo do marketing, que se mostra tão apelativo e faz associações distorcidas quanto ao consumo do álcool, inserindo a idéia, principalmente no jovem, de que consumir bebidas alcoólicas seja para os bravos, te trará mulheres e mais recentemente sirva até como recompensa pelo esforço cotidiano em que o homem esgota suas forças. Quem estoura seus champagnes são os publicitários, que estão com os cofres cada vez mais gordos devido a toda esta rixa irresponsável de ideais alcoólicos que diariamente invade nossas casas.
O segmento que mais se lamuria com a criação da lei é, predominantemente, o das classes mais pobres que, em uma atitude que nos remete ao Romantismo, encontra no álcool a válvula de escape para os tormentos que afligem suas vidas.
Se Cristo tivesse vivido nos dias de hoje, numa tentativa de sair pela tangente e driblar a Lei Seca, quem sabe não teria feito com que os pequenos de um futuro hipotético, em sua primeira comunhão, molhassem suas hóstias no líquido da modernidade, divino para muitos, um deleite sublime, acessível em toda sua suprema plenitude. É considerado o néctar dos deuses por milhares, abrange até os confins mais remotos do planeta e é símbolo do capitalismo em que vivemos: a Coca-Cola.
Por A. Oliveira
Um comentário:
No país da maior empresa de cerveja do mundo, acho difícil ser aprovado um projeto de lei visando restrições nas propagandas de bebidas alcoólicas. Lobby à vista...
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