Fitando o vazio, sustentando olhares pétreos em seus rostos, uma legião de estudantes surge retratada em tons pastéis, gravada em um mural na Welton Academy. Adiante, outra legião de estudantes prepara-se para iniciar a cerimônia de abertura do ano letivo na escola preparatória de rapazes. Estandartes avermelhados sustentam termos como tradição, disciplina e excelência bordados em seus veludos. Em meio aos pais ludibriados com a pompa da instituição, cruzando as fileiras de bancos repletas de novatos tementes aos mestres e professores exageradametne circunspectos, bradando valores impostos violentamente, os alunos marcham em direção ao altar acompanhados por uma gaita de fole. O diretor toma a palavra, inflando de méritos a renomada academia onde leciona, enaltecendo o conservadorismo e o cerimonialismo da circunstância. Ao final de seu breve discurso, é apresentado aos demais mestres, pais e alunos o novo professor de inglês, John Keating (Robin Williams). Há certa inquietude entre os alunos, emana uma contida curiosidade em ver o novo membro do corpo docente. Modestamente, contrastando com a pompa de sua introdução, John se levanta e sorri. A princípio, não se imagina que a presença de Keating vá perturbar o tradicionalismo educacional de Welton. O diretor encerra o evento, aglomerados saem aos jardins, veteranos se dirigem aos quartos, novatos se despedem aos prantos dos pais, a pacificidade está assegurada na escola preparatória americana - ao menos, até inaugurarem as aulas de inglês.
Vencedor do Oscar 1990 por Melhor Roteiro Original, levando como roteirista Tom Schulman e como diretor Peter Weir, Sociedade dos Poetas Mortos (1989) traz Robin Williams em sua face mais romântica, simpática e cativante. A obra ainda venceu prêmios em festivais franceses, italianos e alemães, sendo também indicada para diversas categorias no BAFTA Awards (British Academy of Film and Television Arts), no DGA Awards (Directors Guild of America), no Globo de Ouro e no WGA Awards (Writers Guild of America). O diretor faz uso de variados simbolismos e elipses, tais como utilizava Hitchcock ao sugerir um assassinato, omitindo a real cena e mostrando somente as sombras do ato, gritos de pavor ou pássaros esvoaçando. Na ocasião, as sugestões são mais sutis que as de Alfred, transmitindo, contudo, conteúdo mais introspecto e filosófico.
A Welton Academy leciona suas disciplinas com base em quatro principais pilares: tradição, honra, disciplina e excelência. Todos inseridos na mentalidade estudantil de modo exageradamente ortodoxo, impondo os valores ao invés de ensinando-os. Em meio ao rigor, tradicionalismo e arcadismo, John Keating apresenta aulas dinâmicas, instigantes, interativas e, acima de tudo, apaixonadas. A primeira lição de inglês do ano: Carpe Diem. John expõe aos rapazes a fragilidade da vida, seu valor e a importância de não somente possuir conhecimentos acerca dela, mas também amá-la. Poesia, romance e humanidade são impiedosamente derramados no insosso cotidiano dos jovens em Welton, ausentes de qualquer paixão em seus cérebros repletos de conceitos frios, estáticos e acadêmicos. A partir de então, Neil Perry (Robert Sean Leonard) desvenda um grupo secreto ao qual pertencia seu professor: a Sociedade dos Poetas Mortos. A reabertura da Sociedade é feita pelos jovens estudantes, lendo poemas, fumando cachimbos e fugindo do prédio da escola à meia-noite rumo a uma caverna oculta pela floresta da proximidade. As almas dos estudantes libertam-se. Seus olhos começam a perceber elementos que antes lhes eram sutis e passam a considerá-los absurdos. Entretanto, a interpretação de Carpe Diem se desvenda diferentemente para cada indivíduo dentro da Sociedade. O aprofundamento do senso de união e amor à vida se mantém conciso, mesmo após divergências quanto à compreensão da filosofia do grupo. John Keating vê a evolução em seus alunos de forma tocante, provando que o filme mostra não só a paixão pela humanidade, mas também pelo ensino. O pensamento do grupo evolui a ponto de quebrar correntes que os prendem a destinos que não lhes pertencem, tais como atender à escola de Medicina ou perecer diante de um amor não-correspondido. As lucubrações se ascendem, Keating se exaspera ao ver que formou estudantes apaixonados, pensadores de seu próprio juízo e detentores de valores pessoais. Implicando em um ápice emocional fortíssimo, digno de estremecimentos e arrepios espinais, o enredo chega ao fim levando seus espectadores a lágrimas diante do arrepiante espetáculo da formação acadêmica unida ao fervor que arrebata qualquer ser-humano consciente da complexidade de sua existência. Seize the movie, boys.
Por Renan Trindade
Um comentário:
Se nunca tivesse visto o filme o veria, mas como já o vi, deu-me vontade de vê-lo mais uma vez: Robin Williams consegue, mesmo sendo um ator que não nasceu para este papel, mostrar a realidade dos fatos em uma escola tradicionalista tão quão a Welton Academy.
Gostei da descrição do filme, cativa: para quem nunca viu o filme, que o veja, vale a pena.
Pier Francesco
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