Junto de Mark Wahlberg e Zooey Deschanel, o diretor de O Sexto Sentido (1999), Sinais (2002) e A Vila (2004) traz à tona Fim dos Tempos (The Happening), em cartaz desde último dia treze. Logo de início somos inseridos no conflito da trama, sem espaço para qualquer introdução meticulosa ou mesmo intrigante - o que, de fato, não apresentaria qualquer obstáculo ao filme se não fôssemos deparar com informações tão surreais quanto às que nos são arremessadas por Night. Dá-se o caos: indivíduos, supostamente afetados por uma toxina misteriosa, sofrem danos psíquicos e, momentos depois de infectados, suicidam-se de maneiras mais esdrúxulas possíveis (incluindo o uso de prendedores de cabelo e cortadores de grama). Desse modo, a epidemia se alastra pelos Estados Unidos e acompanhamos a luta pela sobrevivência de Elliot (Mark Wahlberg) e Alma Moore (Zooey Deschanel), juntos da filha de um amigo do casal. A peculiaridade estaria no fato de que Elliot é professor de ciências e, não por acaso, viria a se juntar àqueles que acreditam que a toxina é liberada pelas plantas - e não por terroristas. Percebemos com as freqüentes tomadas amplas, mostrando a aglutinação dos seres humanos, a idéia elementar de Shyamalan: depois de muito alertar, a natureza finalmente se volta contra a humanidade. Princípio indubitavelmente interessante a ser trabalhado no contexto em que estamos, rodeados de questões ambientais e especulações sobre o aquecimento global. Entretanto, Fim dos Tempos demonstra a contínua decaída nas obras de M. Night Shyamalan e a falha de execução em trabalhar a idéia original do roteiro - também escrito pelo diretor.
Sem êxito, diversos gêneros tentaram ser trabalhados em um só filme. Alma e Elliot sustentam durante toda a película um drama enfadonho que só faz atrapalhar mais ainda a visibilidade do espectador em relação ao suspense. Ainda assim, as cenas de real apreensão são raras e eventuais pulos da poltrona se dariam por sustos baratos e tomadas sensacionalistas. A questão da reflexão quanto à crise ambiental é abafada pela descrença dada à sensibilidade de quem assiste ao filme, sendo soterrada por frases de efeito e toneladas de rudez na crítica. Como se não bastassem as pedantes discussões de relacionamento do casal, ainda tropeçamos na ferida mais profunda para filmes de suspense: inverossimilhança. O conceito de plantas dominadoras hegemônicas não é bem desenvolvido e passa por absurdo. Em seu derradeiro suspiro para impressionar o espectador, Shyamalan quase abre mão de sua dignidade ao inserir uma personagem escandalosamente fora de contexto, aparentemente surgida do além, para ilustrar a segunda metade da obra. A senhora repentinamente introduzida apela para os clássicos quadros macabros na parede de casa, comportamentos bizarros injustificáveis, religiosidade alucinada, bonecas macabras e até mesmo paralelos com exorcismo para tentar novamente apreender à força. Finaliza-se o dramalhão amoroso de forma insossa e o desfecho dado ao mistério dificilmente conseguiria cair mais no lugar-comum.
Mark Wahlberg parece flutuar em seu papel, estando sempre um tanto ausente e deslocado da personagem. Zooey Deschanel irrita com suas interrupções impertinentes e mal-concebidas durante a história. Temos, enfim, M. Night Shyamalan decepcionando na execução de seu filme, sugerindo desolado que os tempos de Sexto Sentido se foram.
Por Renan Trindade
2 comentários:
Eu sei que paradoxo é descomunal e pouco aceito.
Por isso mesmo, estou aqui para parabenizar o Regista. Não critico-o, pois o filme é surreal, mas o elogio por esta mesma razão. Em um mundo em que vivemos surrealismos, o filme não poderia ser mais real. Vejam bem, queridos leitores: o conceito do relacionamento amoroso é perfeitamente coerente à situação "tragicômica" que o filme apresenta. Como ver humor nisso? É patético ver como as pessoas perdem o foco real para pensar em coisas mais futeis e temporais. O atemporalismo não interessa. Sou nenhum cinéfilo, mas garanto que, se assistirdes o filme pelo menos 2 vezes, virdes vós que esta situação se encaixa perfeitamente no filme. Os "absurdos" no filme apresentados espelham meramente a verdade cotidiana.
Talvez isso seja uma das razões pelas quais o desenvolvimento sustentável seja tão utópico.
Renan, não estou criticando sua crítica, muito pelo contrário: parabéns a você e aos colaboradores do texto. Parabéns, pois vocês souberam mostrar ao público, sob outro foco, o fato de que os absurdos não deveriam existir, para que pudesse-se pensar no que realmente importa.
Até a próxima, e obrigado mais uma vez pela qualidade dos textos.
Pier Francesco
Morro de rir com as suas ironias, Re.
Não vi o filme, mas acho que depois dessa eu não vou assistir mesmo!
Beijos
G.
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