quinta-feira, 5 de junho de 2008

Cinetoscópio



A amarga humanindade dos atos

Massacres realizados por alunos em escolas norte-americanas não são acontecimentos que podem ser ditos raros, nos últimos tempos. Eis que na semana sobre delitos escolares, não poderíamos deixar de escrever sobre o mais famoso deles: o de Columbine.

"Elefante" (Elephant, 2003, de Gus Van Sant) é um drama que retrata a famosa tragédia sob as mais diversas perspectivas. Cada personagem é apresentado ao público por uma câmera que o segue como um invasor, que começa a acompanhar o desenrolar das situações pela metade, mas que ainda assim permite perceber, mesmo que por um curto período de tempo, seu comportamento e personalidade. Todos têm conflitos, uns aparentemente mais sérios que outros, desde a garota feiosa e sem amigos, até as três bulímicas, superficiais e obcecadas pela aparência, passando pelo garoto cujo pai é alcoólatra e pelos próprios assassinos, que vêem na morte dos colegas uma vingança e a solução para suas angústias, já que ambos se mostram introspectivos e feridos pela exclusão que sofrem por parte dos outros adolescentes.

"Elefante" é, também, um filme silencioso; os personagens passam longos trechos do filme caminhando sozinhos, absortos em si mesmos, sem trilha sonora alguma. As cenas de assassinato são igualmente silenciosas, exceto pelos tiros e gritos. Pode-se dizer, também, que são angustiantes, mas não eletrizantes. São simplesmente realistas. A morte de alguns dos personagens que nos emprestam seus pontos de vista no decorrer do filme, inclusive a de um dos assassinos, transmite, inexoravelmente, a sensação de efemeridade de seus conflitos, juvenis e humanos.

Um recurso curioso utilizado pelo diretor é a repetição de algumas cenas sob perspectivas de diferentes personagens, funcionando como encruzilhadas para situações perpendiculares; o filme não segue a seqüência cronológica à risca e, com isso, sugere desorganização e caos na vida de todos, por mais fúteis que seus problemas possam parecer quando vistos de longe.

"Elefante" é mais do que mais uma das muitas visões cinematográficas sobre a tragédia de Columbine; é peculiar, pois não retrata os dois garotos como fanáticos insandecidos. São dois jovens solitários, um deles talentoso pianista, delicado e tímido, o outro sem brilho. A princípio nem sequer se imagina seus reais papéis na trama. A desconfortável humanidade dos assassinos coloca em cheque a suposta bondade inerente à condição humana e deixa uma indagação: seremos todos assassinos em potencial?

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